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OS DIREITOS TRABALHISTAS EM MEIO À PANDEMIA DO CORONAVÍRUS

O Coronavírus, causador da Covid-19, foi considerado uma pandemia pela Organização Mundial da Saúde. A doença, que foi registrada primeiramente na província de Wuhan, na China, se espalhou pelo mundo.

As previsões acreditam que o vírus, que tem índice de letalidade de 2%, mas de 15% em pessoas com mais de 80 anos, pode infectar até 70% da população mundial. A alta prevalência esperada colocará o Coronavírus no posto de uma das maiores pandemias de todos os tempos.

A humanidade já enfrentou outras pandemias, como a Peste Bubônica, Gripe Espanhola, Varíola, Tifo, Cólera e outras mais, sendo que praticamente todas elas, nós acompanhamos apenas pelos livros de história. 

Assim, o Coronavírus já pode ser considerada a maior pandemia da atual geração, a qual vem tomando grandes proporções, principalmente pela era das redes sociais e da informação instantânea.

A Lei nº 13.979, sobre o novo Coronavírus, foi sancionada no dia 06/02/2020 e tem previsão para vigorar enquanto durar a emergência internacional do surto, decretada pela Organização Mundial da Saúde no fim de janeiro.

De acordo com o texto, o governo poderá colocar cidadãos em isolamento ou quarentena, sob condições estabelecidas pelo Ministério da Saúde, podendo ainda, realizar compulsoriamente exames e testes laboratoriais, coletar amostras para análises e aplicar vacinas e tratamentos médicos específicos.

O cenário de pandemia, já tem mudado a rotina em escritórios, fábricas e demais ambientes de trabalho. Adoção do home office, suspensão de eventos, viagens canceladas, quarentena doméstica para casos suspeitos ou confirmados são algumas das medidas tomadas.

A imprevisibilidade da duração da pandemia traz uma grande preocupação a todos, sejam eles empregados ou empregadores. O fato é que todos serão prejudicados e o bom senso deve prevalecer, visando a proteção da vida de todos os envolvidos.

De nada irá adiantar, se os empregados não entenderem o atual momento vivido, achando que o empregador deverá manter todos os pagamentos em dia, mesmo sem estar em funcionamento. Da mesma forma, o empregador precisa entender que o empregado também possui contas para pagar, assim como ele.

O receio da contaminação, a decretação de quarentena, ou o isolamento voluntário, produzem efeitos econômicos imediatos e devastadores. Como o empregador conservará os empregados inativos, pagando-lhes salários e encargos, dará férias coletivas, ou será forçado a dispensá-los? O pagamento de rescisões traria passivos insuportáveis.

Grandes industrias que mobilizam milhares de empregados, com folhas mensais de salários de milhões de reais, onde encontrarão recursos para persistir em atividade?

Até quando os empregadores conseguirão sustentar a folha de pagamento? Além dos custos com matéria prima, fornecedores, impostos e taxas, as obrigações com salários, férias, depósitos do FGTS, contribuições previdenciárias, são inadiáveis.

Estamos na primeira fase de crise, sem meios de prever quando e como a vida retomará a normalidade, sendo que qualquer afirmação em sentido contrário será mero palpite.

Diante desse cenário, ficam os questionamentos sobre quais providencias podem ser tomadas no ambiente laboral, visando minorar os prejuízos financeiros para todos os envolvidos.

A legislação nos traz algumas respostas, como férias coletivas, licenças remuneradas ou não, rescisão de contratos por motivo de força maior, utilização de banco de horas, redução dos salários e outras medidas.

A FORÇA MAIOR

A Força maior (force majeure) é um conceito clássico do Direito desenvolvido no direito romano e presente nas codificações jurídicas atuais.

Gaio conceituou força maior como “vis major est cui humana infirmitas resistire non potest“, frase da qual se pode depreender que força maior é aquela a que a fraqueza humana não pode resistir.

São acontecimentos relacionados a fatos externos, independentes da vontade humana e que impedem o cumprimento das obrigações. Esses fatos externos podem ser: ordem de autoridades (fato do príncipe), fenômenos naturais (raios, terremotos, inundações, etc.) e ocorrências políticas (guerras, revoluções, etc.).

A Consolidação das Leis do Trabalho dedica um dos capítulos a Força Maior, definido pelo Art. 501, como: “todo acontecimento inevitável em relação à vontade do empregador, e para o qual este não concorreu, direta ou indiretamente”. 

A Lei 4.923, de 23/12/65, conhecida à época como “lei de crise”, prevê a redução temporária de salários, por prazo certo, não excedente de 3 (três) meses, prorrogável nas mesmas condições, mediante negociação coletiva, na empresa que “em face de conjuntura econômica, devidamente comprovada”, se encontrar diante de dificuldade insuperável, 

No Código Civil ela é objeto do Art. 393, cujo texto afirma: “O devedor não responde por prejuízos resultantes de caso fortuito ou de força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado”. Verifica-se o caso fortuito ou de força maior, diz o parágrafo único, “no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”.

Portanto, não restam duvidas de que se enquadra na atual situação do Coronavírus, diante de sua imprevisibilidade.

POSSIBILIDADE DE HOME OFFICE

Uma das medidas sugeridas para evitar a aglomeração de pessoas é o home office ou teletrabalho, definido como a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, não se configurando em trabalho externo.

Numa situação de pandemia, é uma saída para os empregadores não perderem, ou não reduzirem, a mão de obra e a produtividade, reduzindo custos com energia, água, telefone, etc.

Entretanto, conforme dispõe a legislação, a implantação desta modalidade de trabalho necessita de mútuo consentimento, uma vez que o empregado não é obrigado a aceitar esta condição. Para tanto, se aconselha que haja aditivo contratual com esta previsão, ou até mesmo uma negociação coletiva para o período de pandemia.

Importante destacar que embora temporariamente o empregado esteja trabalhando em casa, o local contratual da prestação do serviço continua sendo o endereço da empresa.

AFASTAMENTO DE FUNCIONÁRIOS

A Lei nº 13.979/20, em seu Art. 3º, traz que para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as medidas de isolamento, quarentena e realização compulsória de exames e teste laboratoriais.

O §3º do referido artigo, traz que será considerada falta justificada o período de ausência decorrente de isolamento ou quarentena de pessoas contaminadas ou com suspeita de contaminação, devidamente comprovada através de atestado médico.

Assim, os 15 (quinze) primeiros dias de afastamento do empregado serão remunerados pela empresa e os demais, pelo INSS.

A portaria 356/20 do Ministério da Saúde estabeleceu que o isolamento tem duração de 14 (quatorze) dias, podendo se estender por igual período se exames comprovarem risco de transmissão. Já a quarentena tem prazo máximo de 40 (quarenta) dias, também podendo se estender pelo tempo necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde no território.

Lembrando que o afastamento sem a devida comprovação medica, poderá ocasionar o desconto dos dias ausentes, até mesmo o reconhecimento de demissão por justa causa por abandono de emprego.

FÉRIAS COLETIVAS

As empresas afetadas têm a opção de conceder férias coletivas de pelo menos 10 (dez) dias a todos os empregados e/ou setores específicos nos termos do Art. 139 da CLT. 

Os §§ 2º e 3º exigem um aviso ao Sindicato e a Secretaria Regional do Trabalho com 15 (quinze) dias de antecedência. Mas em situações excepcionais como essa, deve prevalecer o bom senso, dispensando o prazo indicado, bastando a comunicação aos sindicatos representativos e afixação de aviso nos locais de trabalho, com a devida justificativa.

Os empregados contratados há menos de 12 (doze) meses gozarão, na oportunidade, férias proporcionais, iniciando-se, então, novo período aquisitivo.

Há também a opção de decretar recesso, que prescinde o pagamento de 1/3 de férias, mas cujo período não será deduzido no cômputo das férias anuais.

RESCISÃO CONTRATUAL POR MOTIVO DE FORÇA MAIOR MOTIVADA POR ATO GOVERNAMENTAL

O Art. 486 da CLT traz uma situação ainda mais grave, que é a possiblidade de rescisão contratual por força maior, quando há a paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade.

Temos notícias, por exemplo, de paralisações por prazo indeterminado no futebol brasileiro, assim como de Shoppings e Bares por 15 (quinze) dias, eventos com grandes aglomerações por 30 (trinta) dias e com possibilidade de extensão.

Essa situação também é conhecida como Fato do príncipe, sendo uma ação estatal de ordem geral, que não possui relação direta com o contrato, mas que produz efeitos sobre este, onerando-o, dificultando ou impedindo a satisfação de determinadas obrigações, acarretando um desequilíbrio econômico-financeiro.

Assim, o referido artigo traz que nesses casos específicos, sendo impossível a continuidade da atividade profissional, os empregadores poderão rescindir os contratos de trabalho dos empregados e o pagamento da indenização ficará a cargo do governo responsável pela paralisação das atividades, o que por obvio, gerará grandes discussões junto a Justiça do Trabalho.

REDUÇÃO SALARIAL

Outra hipótese que a CLT nos traz em casos de força maior, está disposto no Art. 503, que é a possibilidade de redução salarial em até 25% (vinte e cinco por cento), respeitado o salário mínimo vigente, situação já prevista pela Lei 4.923/65.

Assim, é lícita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25% (vinte e cinco por cento).

A legislação não traz a obrigatoriedade de assistência Sindical no caso em questão, mas um acordo coletivo se mostra imprescindível para fim de salvaguardar a empresa de ações trabalhistas futuras.

Cessados os efeitos decorrentes do motivo de força maior, é garantido o restabelecimento dos salários reduzidos.

CONCLUSÃO

Além das hipóteses trazidas acima, outras medidas podem ser pactuadas conjuntamente entre Sindicatos e partes interessadas, como maiores reduções salariais, suspensão de benefícios, redução de carga horaria e até mesmo licenças não remuneradas por um determinado período, em troca da garantia de que a empresa não irá demitir os seus colaboradores.

Estamos apenas iniciando uma grave crise e novas medidas ainda devem ser tomadas pelos Governantes, que não podem fugir de suas responsabilidades diante de empregadores e empregados, vítimas de imprevisível e irresistível força maior. 

Dentro dos limites da legalidade, tudo deve ser feito para superar ou reduzir a crise, com o menor número possível de baixas e de prejuízos, assim como de falidos e falecidos.

Conforme já divulgado, as empresas poderão adiar, em 3 (três) meses, o pagamento do Simples Nacional e o depósito do FGTS dos trabalhadores.

Em auxilio aos empregados, já foi divulgada a antecipação do 13º de aposentados e pensionistas do INSS para maio, assim como há a previsão de nova liberação para saques de FGTS depositados.

Inevitáveis demissões irão ocorrer, sendo que uma hipótese de auxilio poderá ser a isenção do empregador quanto ao pagamento da indenização de 40% do FGTS, ou reduzi-la substancialmente, por exemplo. Assim, o empregado poderá receber os depósitos corrigidos do FGTS e contará, com o seguro desemprego.

Infelizmente a crise chegará a nossa casa, o nosso local de trabalho, a nossa empresa e na ausência de medidas sensatas e bom senso de todos, a situação poderá piorar. 

O futuro de todos, sejam eles empregadores, empegados, autônomos ou aposentados, depende do grau de conscientização do Poder Executivo, mas principalmente do povo e só iremos vencer a crise se estivermos unidos.

Por Dr. Rodrigo Menezes, advogado especialista em Direito do Trabalho e Desportivo.

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